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Mulheres e meninas afrodescendentes: visibilidade é dignidade e poder

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“As mulheres e meninas afrodescendentes não são apenas vítimas de um sistema desigual, somos também lideranças, pensadoras, escritoras, mães, artistas, estudantes, advogadas, pescadoras, guardiãs de saberes ancestrais e tudo o que quisermos ser,” disse Franciele Silva, estudante brasileira de direito da Universidade Federal da Bahia.

O Dia Internacional das Mulheres e Meninas de Ascendência Africana, comemorado pela primeira vez neste dia 25 de julho, é um apelo para ir além das declarações e avançar para ações ousadas e transformadoras, incluindo investimentos em educação, combate a estereótipos e garantia de representatividade na liderança.

“Este dia é uma forma de visibilizar nossas lutas, nossas existências e nossas contribuições, que muitas vezes são apagadas ou silenciadas,” disse Silva.

Para Hanadi Saad Al Farhan, profissional humanitária e de desenvolvimento comunitário sediada em Basrah, Iraque, e ex-bolsista da ONU de ascendência africana, este dia lembra ao mundo que as mulheres e meninas de ascendência africana são importantes.

“Visibilidade é dignidade. É um apelo ao reconhecimento, não apenas das injustiças históricas que enfrentamos, mas também das lutas contínuas contra o racismo sistêmico, a exclusão e o apagamento”, disse Saad Al Farhan. “É também um dia para valorizar nossa resiliência, cultura e contribuições, que muitas vezes são ignoradas.”

No Iraque, explicou Saad Al Farhan, as pessoas de ascendência africana são praticamente invisíveis no discurso público. Dias internacionais como este criam um espaço para que elas possam expressar sua verdade e afirmar seu lugar na sociedade.

Justina Obaoye-Ajala, advogada internacional de direitos humanos e pesquisadora sênior para direitos indígenas e de minorias e pessoas de ascendência africana, ecoou essa perspectiva.

“Por muito tempo, as lutas, forças e triunfos das mulheres e meninas de ascendência africana foram apagados ou marginalizados na história, na formulação de políticas e até mesmo nos principais movimentos feministas”, disse Obaoye-Ajala.

“Neste dia, a ONU Direitos Humanos não apenas homenageia suas contribuições para a sociedade, mas também reconhece as desigualdades estruturais persistentes que continuam a marginalizá-las”, disse Marie Joseph Ayissi, oficial de direitos humanos da ONU Direitos Humanos e secretário do Grupo de Trabalho de Especialistas sobre Pessoas de Ascendência Africana (WGEPAD).

Hanadi Saad Al Fahran, profissional humanitária e de desenvolvimento comunitário sediada no Iraque. Ela também é ex-bolsista da ONU de ascendência africana. © Programa de Bolsas para Líderes do Iraque.

Saad Al Fahran disse que, mesmo em contextos profissionais, as mulheres de ascendência africana sentem que precisam trabalhar o dobro para ganhar o mesmo respeito.

“Um dos maiores desafios é que a discriminação está tão normalizada que muitos nem a veem como um problema. É por isso que a documentação, a conscientização e a solidariedade são tão importantes”, acrescentou.

Silva, que nasceu no Quilombo Rio dos Macacos, uma comunidade afro-brasileira, disse que sua experiência foi marcada tanto pela resistência quanto pela esperança.  Um quilombo é uma comunidade afro-brasileira tradicional fundada originalmente por africanos escravizados que escaparam da escravidão e formaram assentamentos autogovernados. Hoje, muitos quilombos continuam a defender suas terras ancestrais, cultura e identidade coletiva, ao mesmo tempo em que lutam por direitos à terra e justiça social. Silva disse que crescer em um quilombo lhe ensinou o valor da comunidade, da ancestralidade e da luta pelos direitos humanos.

Franciele Silva, coordenadora da Associação Quilombola e estudante de Direito no Brasil. Ela também é ex-bolsista indígena da ONU. © Franciele Silva.

“Ao mesmo tempo, enfrento diariamente os reflexos do racismo estrutural: a invisibilidade, a violência institucional, a negação de direitos básicos e o constante esforço para provar nossa legitimidade em espaços que ainda não foram pensados para nós”, disse Silva.

Na China, Obaoye-Ajala se tornou a primeira advogada africana a comparecer aos tribunais chineses. No entanto, seu trabalho não aconteceu sem resistência.

Justina Obaoye-Ajala, advogada internacional nigeriana especializada em direitos humanos, radicada na China. Ela também é ex-bolsista sênior dos Programas de Bolsas de Estudo para Indígenas e Descendentes de Africanos da ONU.

“Enfrentei resistências estruturais e institucionais. Esses desafios não eram apenas profissionais; eram profundamente pessoais”, disse Obaoye-Ajala. “Eles revelaram como raça, gênero e status migratório se cruzam de maneiras que amplificam a marginalização, especialmente em sistemas que não foram projetados para acomodar diferenças.”

Seja em um quilombo no Brasil, em uma comunidade no Iraque ou em um tribunal na China, suas experiências apontam para a natureza global das formas sobrepostas de discriminação.

“A discriminação sobreposta, também conhecida como discriminação interseccional, refere-se aos sistemas compostos e interligados de opressão enfrentados por mulheres e meninas de ascendência africana”, disse Obaoye-Ajala.

A ONU Direitos Humanos observa que, embora mulheres e meninas de ascendência africana tenham estado na vanguarda dos movimentos por justiça e igualdade, suas contribuições são frequentemente ignoradas, mesmo quando continuam a enfrentar profundas disparidades na saúde, educação, emprego e no sistema de justiça criminal.

“A discriminação sobreposta não é simplesmente uma “dupla opressão”; é uma matriz de injustiça estrutural.“

Justina Obaoye-Ajala, advogada internacional de direitos humanos e ex-bolsista sênior dos Programas de Bolsas de Estudo para Indígenas e Descendentes de Africanos da ONU, Nigéria

Saad Al Farhan explicou que, no Iraque, uma mulher afro-iraquiana pode enfrentar discriminação no trabalho devido à cor da pele e estigma social por se manifestar ou buscar uma posição de liderança.

Da conscientização à ação

Saad Al Farhan enfatizou a necessidade de políticas interseccionais que abordem raça e gênero em conjunto, pedindo representatividade, espaços seguros e investimento em educação, emprego e conscientização cultural. Obaoye-Ajala acrescentou que mudanças sistêmicas são essenciais, incluindo reformas legais, coleta de dados, apoio a movimentos feministas negros e foco na experiência vivida. Silva concordou, enfatizando que as experiências das mulheres negras devem impulsionar e moldar a mudança.

A ONU Direitos Humanos considera essencial que leis antidiscriminação sejam adotadas e aplicadas, e que abordagens baseadas em gênero sejam totalmente integradas a todos os programas relevantes, usando dados desagregados para garantir que as políticas reflitam as realidades vividas pelas pessoas mais afetadas.

O Escritório apoia esse trabalho por meio de parcerias com a sociedade civil, realizando pesquisas e fornecendo orientação aos Estados. Por meio de seu Programa de Bolsas para Pessoas de Ascendência Africana, o Escritório treinou mais de 160 agentes de mudança de 50 países, 72% dos quais são mulheres, para defender a igualdade em nível nacional e internacional.

“Agradeço profundamente o trabalho da ONU Direitos Humanos em amplificar as vozes daqueles que muitas vezes não são ouvidos”, disse Saad Al Farhan. “Seu foco nos direitos humanos, no antirracismo e na igualdade de gênero dá legitimidade a lutas como a nossa. Quando organizações internacionais como a ONU Direitos Humanos reconhecem nossas comunidades e histórias, isso envia uma mensagem poderosa de que nossos direitos são importantes.”

Para Obaoye-Ajala, o trabalho do Escritório representa uma combinação poderosa de liderança visionária e ação prática.

“Minha experiência com a ONU Direitos Humanos tem sido inspiradora e gratificante, e sinto-me honrada por ter contribuído para sua importante missão”, disse ela.

Silva afirmou que o Escritório constrói pontes entre comunidades marginalizadas e mecanismos internacionais de proteção e reparação.

“A luta pela equidade deve estar enraizada na escuta ativa e no reconhecimento do nosso poder”, disse Silva.

“Que este dia nos inspire a continuar caminhando juntos, construindo um futuro onde nossa existência não seja definida pela resistência, mas pela liberdade e escolha plenas.”

Franciele Silva, estudante de Direito e ex-bolsista indígena da ONU, Brasil

FIM

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