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“Há esforços muito importantes em matéria de justiça em muitos países”, observou Ariel Dulitzky, quando concluiu a sua missão oficial no Chile (13 a 21 de agosto).

(30 de agosto de 2012) Viviana Díaz tem 61 anos e lembra como se fosse ontem a manhã que o pai dela, Víctor Díaz, recebeu uma telefonema e despediu-se dela, da sua mulher e dos outros dois filhos, e saiu da casa familiar em Santiago do Chile. Era 11 de setembro de 1973, e foi a última vez que Viviana viu o pai.

“Depois começaram as invasões do nosso domicílio, onde os agentes procuravam o meu pai, que foi viver na clandestinidade durante 32 meses”, conta Viviana. A madrugada de 12 de maio de 1976, o seu pai foi encontrado, torturado e preso por agentes da Direção de Inteligência Nacional (DINA).

“Nesse momento começou uma busca que continua até hoje”, explica Viviana, quem dedicou a sua vida a apurar o que aconteceu com o seu pai e os outros mais de mil pessoas desaparecidas que deixou a ditadura chilena. Três comissões nacionais de verdade e reparação (conhecidas como Comissões Rettig, Valech I e Valech II) contabilizaram um total de 1.110 vítimas de desaparecimentos forçados, dos que foram restados sete casos classificados erradamente para obter um total de 1.103 casos de desaparecimentos forçados no Chile.

Segundo o artigo 2 da Convenção Internacional para a proteção de todas as pessoas contra os desaparecimentos forçados (2006), o desaparecimento forçado pode ser definido como a prisão, a detenção, o sequestro ou qualquer forma de privação de liberdade que seja obra de agentes do Estado ou cometidas por pessoas ou grupos de pessoas que agem com a autorização, o apoio ou a aquiescência do Estado, seguida da negação de reconhecimento dessa privação de liberdade ou do ocultamento do destino ou o paradeiro da pessoa desaparecida, subtraindo-a da proteção da lei.

A Convenção considera que a prática generalizada ou sistemática do desaparecimento forçado é um crime contra a humanidade, como consta no direito internacional. Além disso, este tratado internacional obriga os Estados a criminalizar o desaparecimento forçado.

América do Sul: o caminho para a verdade

 

O uso sistemático dos desaparecimentos forçados como ferramenta de repressão e tortura fez parte das diversas ditaduras que afetaram a América do Sul entre as décadas de 1960 e 1980.

Para Ariel Dulitzky, especialista do Grupo de Trabalho das Nações Unidas sobre Desaparecimentos Forçados e Involuntários, a região foi o lugar onde aconteceram com frequência e foram aperfeiçoadas as práticas do desaparecimento forçado. Porém, a América do Sul é hoje em dia “um espaço onde as soluções criativas para responder ao fenômeno dos desaparecimentos forçados estão em pleno processo”.

“Há esforços muito importantes em matéria de justiça em muitos países”, observou Dulitzky, quando concluiu a sua missão oficial no Chile (entre 13 e 21 de agosto) juntamente com outra perita do Grupo de Trabalho, Jasminka Dzumhur. “Nós pensamos que na área de justiça é impressionante o avanço feito pelo Chile. Aprendemos que mesmo que a lei de anistia continue vigente, pode haver julgamentos e condenas às pessoas responsáveis de desaparecimentos forçados”.

Ele ressaltou que em toda a região existem avanços importantes como condenas a ditadores e todo tipo de oficiais de diferente hierarquia. “Hoje existem casos abertos em muitos países que não apenas buscam os agentes militares ou de forças de segurança envolvidos em desaparecimentos forçados, mas também civis que foram cúmplices. É uma mudança muito importante”, disse Dulitzki.

Na Argentina, organizações de direitos humanos calculam 30 mil pessoas desaparecidas por causa da ditadura militar do país, somando o roubo e apropriação sistemática de 500 bebês. “Na área de desaparecimentos forçados, a Argentina tem uma liderança clara na região, é um exemplo de como as coisas devem ser feitas”, diz Luciano Hazan, integrante do Comitê das Nações Unidas sobre Desaparecimentos Forçados e advogado da agrupação Avós da Praça de Maio.

Apesar do tamanho da tragédia, “a Argentina está na vanguarda em matéria de reparação para as vítimas e as suas famílias, na construção de espaços de memória, a busca de justiça e o fim da impunidade”, concorda Estela de Carlotto, presidenta de Avós da Praça de Maio. A lei de nulidade das leis de anistia, os 600 processados e centos de julgamentos em processo por crimes contra a humanidade cometidos durante a ditadura e a constante procura dos bebês sequestrados por agentes militares são algumas das iniciativas de destaque na região.

Outros avanços importantes ocorreram recentemente no Uruguai, que em março de 2012 realizou um ato de reconhecimento da responsabilidade do Estado pelo sequestro e desaparecimento de María Claudia García de Gelman, para cumprir com a sentença da Corte Interamericana de Direitos Humanos. Na ocasião, o próprio Presidente José Mujica expressou o seu compromisso com a justiça e a sua vontade de que fatos como esses não sejam repetidos no país.

Para Dulitzky, o caso de Brasil também é um claro exemplo dos avanços na luta contra a impunidade na região. Em 16 de maio de 2012, o governo brasileiro instalou uma Comissão Nacional da Verdade, com o objetivo de determinar as responsabilidades sobre crimes contra a humanidade cometidos durante a ditadura militar.

A Comissão terá dois anos para preparar um relatório sobre os abusos dos direitos humanos cometidos entre 1946 e 1988. Contudo, os responsáveis dos crimes não poderão ser julgados por conta de uma Lei de Anistia que protege as pessoas envolvidas nos regimes ditatoriais do país.

Entre os seis países com que trabalha o Escritório Regional para América do Sul do Alto Comissariado das Nações Unidas para os Direitos Humanos, o Peru é o único que ainda não ratificou a Convenção Internacional para a proteção de todas as pessoas contra os desaparecimentos forçados. Porém, o Congresso peruano trabalha atualmente nesse processo.

Desde o sequestro da sua filha grávida de três meses em 1977, Estela de Carlotto não parou de procurar o seu neto, Guido. “Durante a ditadura foi executado um plano de roubo de bebês: sequestraram e torturaram moças grávidas, roubaram os filhos delas e depois foram mortas. A criança roubada crescia com outro nome e identidade”, explica Estela.

Em agosto, a agrupação argentina anunciou a recuperação do neto no. 106, identificado como Pablo Gaona Miranda, que foi sequestrado quando tinha um mês de idade e adotado por um coronel aposentado. Como ele, há ainda 400 casos por resolver.

“Não queremos nem perdão nem reconciliação. Queremos verdade, justiça e o peso da lei. Alguns querem que esqueçamos o que aconteceu, mas nós dizemos que jamais”, ressalta Estela, para quem é fundamental revelar a verdade dos horrores dos desaparecimentos forçados da ditadura, com o objetivo de que o seu uso sistemático na região não seja repetido.

FIM

Veja folha informativa do Escritório Regional para América do Sul sobre a Convenção: https://acnudh.org/?p=483  

 

Confira os Comentários Preliminares do Grupo de Trabalho sobre Desaparecimentos Forçados após visita ao Chile entre 13 e 21 de agosto (em espanhol): https://acnudh.org/?p=15359

 

Ler comunicado do Grupo de Trabalho sobre Desaparecimentos Forçados no final da sua missão no Chile: https://acnudh.org/?p=15366

 

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