BRASÍLIA (24 de maio de 2024) – Com o objetivo de unir forças para enfrentar a discriminação contra o povo cigano/romani, a ONU Direitos Humanos para a América do Sul, em colaboração com organizações da sociedade civil, organizou o encontro “80 anos do Holocausto Romani – Mulheres, Memória e Violência no Brasil”.
O evento, realizado de maneira virtual o 16 de maio, reuniu pessoas defensoras para discutir sobre a histórica rota do anticiganismo e como ela impacta a vida das mulheres romanis no Brasil, bem como as diferentes estratégias para combater o racismo e fortalecer a luta dessas mulheres.
Durante o encontro, o Representante da ONU Direitos Humanos para a América do Sul, Jan Jarab, relembrou a histórica do anticiganismo no país e ressaltou o poder das mulheres em empreender mudanças. Ele afirmou que é necessário impulsar essas transformações e construir espaços seguros para que cada vez mais mulheres romanis possam falar sobre suas experiencias e criar estratégias para superar os desafios de forma conjunta.
No encontro, que teve o apoio da AMSK/Brasil, IRU South América, Observatório Internacional de Mujeres Gitanas, Urban Nômads e o Coletivo DOSTA/Basta, participantes demonstraram como o povo romani, especialmente as mulheres, estão vulneráveis ao sistema que não oferece uma base de apoio e um mecanismo de defesa efetivo, e onde o estereótipo faz parte do racismo estrutural e epistêmico que enfrenta o povo romani, legitimando a exclusão, a apropriação cultural e até mesmo a violência policial.
Luta contra o anticiganismo
No encontro, diversas mulheres romanis compartilharam os desafios diários que enfrentam na luta contra estereótipos e outras formas de racismo. Elisabete Kuczmenda, professora e pedagoga romani, relatou que no Brasil o povo romani muitas vezes é entendido como um grupo religioso inclusive pelo Estado, o que gera um enorme constrangimento principalmente para as mulheres desta etnia.
Para Carolina Guimarães, defensora dos direitos humanos e ativista romani, estes estereótipos também favorecem o discurso de ódio e a violência no espaço virtual. Já Anne Kellen Cavalcante, ativista romani e integrante da AMSK, complementou dizendo que a apropriação cultural causa um dano imenso às pessoas romanis porque a cultura é peça constitutiva da identidade de um povo, não é fantasia.
As participantes do evento também fizeram uma homenagem às famílias sobreviventes do holocausto, inclusive àquelas que buscaram refúgio no Brasil. A integrante do grupo sinti e doutora em literatura pela Universidade Nacional de Brasília (UNB), Vória Stafanovsky, explicou como neta de sobrevivente que esse episódio trágico do passado transformou e deformou as famílias que até hoje sofrem com as consequências.
No entanto Elisa Costa, presidente da AMSK, afirmou que para obter mudanças concretas, é fundamental ter mulheres romanis ocupando cargos e liderando espaços de poder e de decisão tanto no Estado como nos organismos internacionais, principalmente naqueles que desenvolvem projetos vinculados a temática. Outro tema importante levantado pelos participantes foi a importância das construções de redes de apoio e de proteção para mulheres romanis.
Yuri Costa, defensor público federal, reafirmou o compromisso de mais de dez anos da Defensoria Pública da Uniao (DPU) com os povos romanis e ressaltou contribuições recentes que esta instituição ofereceu para a pauta. O primeiro foi a atuação administrativa da DPU para que o Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (IBAMA) reconhecesse o povo cigano como parte dos “povos e comunidades tradicionais”. Este reconhecimento ocorreu em 2024. A segunda diz respeito às sugestões que a DPU realizou, a partir de discussões que empreendeu com a sociedade civil, de alteração de um projeto de lei que cria o Estatuto dos Povos Ciganos.
Sobre o Estatuto, as mulheres participantes do evento pediram para que suas vozes sejam escutadas, que as suas necessidades sejam realmente contempladas, de acordo com a convenção 169 da OIT. Leda Oliveira, mulher romani e estudante de mestrado na UNB, foi enfática ao afirmar que o Estatuto deve garantir que todas as mulheres romanis frequentem as escolas de acordo com o Estatuto da Criança e do Adolescente, sem exceção.
Desde 2006, celebra-se oficialmente todos os 24 de maio o Dia Nacional do Povo Cigano no Brasil. Este ano é particularmente especial, pois também marca os 80 anos do Holocausto Romani, durante o qual estima-se que cerca de 500 mil pessoas romanis foram assassinadas.
Para o Representante da ONU Direitos Humanos para a América do Sul, Jan Jarab, “esta data é uma oportunidade ímpar para refletir sobre esse passado sombrio e seu impacto no presente. Ela também nos convoca a fortalecer a luta contra o anticiganismo, uma forma específica de racismo dirigida ao povo romani, alinhando-nos aos objetivos da Agenda 2030. As mulheres, cujas memórias foram duplamente silenciadas, desempenham um papel central nesse processo.”
FIM
Saiba mais
- Na íntegra: discurso do Representante da ONU Direitos Humanos para a América do Sul, Jan Jarab: LINK
- Conheça o Mapa da Memória Romani nas Américas, clicando aqui. A chamada para novas contribuições está aberta até o dia 15 de julho.
- Para mais informações sobre as ações da ONU Direitos Humanos relacionadas ao povo romani, clique aqui.
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